Luta e empoderamento: pescadoras falam sobre desafios no Baixo Amazonas

No trajeto entre a casa e o rio, as pescadoras artesanais enfrentam diferentes desafios. Entretanto apesar das dificuldades, elas ampliaram seus espaços de participação, produção e passaram a contribuir nas discussões em diferentes esferas de poder, por meio de seu engajamento comunitário e decisões coletivas. A pescadora também se destaca por reconhecer os recursos pesqueiros como potencial para segurança alimentar, assumindo um papel central no uso sustentável dos recursos naturais.

Jacira de Lima, pescadora, 49 anos. Foto: Arquivo pessoal.

Jacira de Lima, pescadora, 49 anos. Foto: Arquivo pessoal.

A rotina é dura. Elas acordam ainda durante a madrugada, preparam o café da família, deixam almoço pronto e seguem muito cedo para o rio. Com canoa, remo e apetrechos de pesca vão em busca do alimento e subsistência para a família. É o pescado necessário para garantir renda, alimentação e pagar as contas. A realidade da pescadora artesanal é dura, repleta de desafios diários que fazem da mulher ribeirinha o símbolo da força e do empoderamento.

“A mulher pescadora enfrenta muitas dificuldades no reconhecimento quando vai buscar benefício. Dificuldade de reconhecimento até na base porque tem pescador que acha que a mulher não pesca. Muitos dizem que não somos obrigadas a pescar de segunda a sexta. Mas nós mulheres temos um trabalho até maior, porque quando a gente chega em casa vai fazer comida, cuidar de filho, arrumar a casa, lavar louça [...] O homem não. Quando chega vai esperar a janta aprontar. A gente mulher trabalha mais do que o homem pescador” – desabafou a pescadora Jacira de Lima que foi durante dez anos coordenadora de núcleo de base da Área verde e atualmente exerce a função de membro do conselho fiscal da Colônia de Pescadores Z-20.

Na região do Baixo Amazonas, a mulher pescadora busca desde 1970 a garantia dos próprios direitos onde aos poucos foi conquistando seu espaço. Reflexo disso é a participação ativa das mulheres em cargos de liderança nas organizações sociais. “Existem 22 pescadoras coordenando os núcleos de base da Z-20 e a região que tem o maior número de mulheres à frente do núcleo de base é Urucurituba” - contou a pesquisadora da Sapopema, Wandicleia Lopes.

Sônia Leão, arquivo Colônia de Pescadores Z20.

Sônia Leão, arquivo Colônia de Pescadores Z20.

Referência para a categoria, Sonia Leão exerceu função de liderança durante muitos anos. Hoje com 87 anos é memória viva dos fatos históricos que marcaram a luta das pescadoras artesanais: “A gente reunia nas caladas da noite, se organizava, cada uma de nós tinha uma tarefa pra fazer em uma comunidade. Era na base do segredo. As mulheres pescavam mas não tinham direitos em nada. Foi o tempo que nós começamos a lutar para que as mulheres tivessem direito a diretoria, Conselho de pesca e a todos os movimentos que tinha na Colônia, e participar do direito à aposentadoria que não tinha, seguro desemprego” – relembra.

Josana Pinto. Arquivo pessoal.

Josana Pinto. Arquivo pessoal.

Na força da união elas encontraram o suporte para assumir funções anteriormente ocupadas apenas pelo público masculino. Para elas a representatividade é resultado do esforço coletivo, conta Josana Pinto, 44 anos, pescadora há 27 anos, moradora de Óbidos: “Hoje eu vejo que nós mulheres, nossos maiores desafios como mulheres empoderadas está em enfrentar o machismo. Porque muitos homens não admitem que nós temos conhecimento, que nós somos capazes, que nós sabemos fazer tão bem quanto eles. Nós não queremos disputar espaço, nós queremos ter os nossos direitos. Queremos ser respeitadas de forma igual. Tudo que nós queremos é reconhecimento. Nós estamos na luta, se for para enfrentar preconceito, machismo, nós vamos continuar lutando até que todos os nossos direitos sejam reconhecidos e conquistados a partir de nós mesmos”.

Aprofunde esta leitura em um artigo cientifico: “Pescadora artesanal: Entre a casa e o rio” clicando aqui.

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